Citações

A palavra é o fio de ouro do pensamento.


SÓCRATES

domingo, 14 de dezembro de 2008

Chove lá fora e aqui(perna bamba é do samba)




Quando chove como agora no Rio de Janeiro, então toda a cidade chora em um só tempo; Tempo fechado, foge o azul, no céu fito o cinzento.
Faz vento e o quando esfria, levando a calmaria.
Nesse lamento essa cidade mulher se assenhora, quieta, parada, silenciosa quando chora.
Despindo tristezas de pedra no seu corpo negro, da gávea de granito, da embarcação que ancora.
Os dois irmãos monolíticos avistam a boca do mar, carpindo as outras pedras, num estrondo repetido.
Pedra do pão, pedra do sal, pedra bonita.Rampa dos embarcados no ar das gaivotas.
Com sua firmeza escorregadia de perigo a solta, pedra feita de açúcar é almirante negro da baía.
Tem em seu peito as esquadras do porto e as chibatas da revolta, com os pés cravados na areia, lavados na espuma derramada a força cândida.
O açoite verde de mata atlântica minguante vem, e também pisa à beira, o mar.
Levitando no limo do surfe, a esgrima fina das marés e dos corpos em luta.
Trapezistas em suas tábuas de equilíbrio são canoas de pescadores, em humana ousadia.
vorazes e velozes dominadores de ondas em harmonia com o tempo das espumas.
Das costas negras marinadas, grandes corcovas rígidas, o granito Tijuca ronda.
Com a imponência e a firmeza de guerreiro solidário, em vigília maciça, atento a tudo à sua volta.
Legião de pedras, formam a grande muralha milenar em guarda.
Vidigal e Rocinha avistam tudo do alto com os seus olhos humanos.
São faróis habitados por gente simples, também ela equilibrista na coragem das encostas íngremes, tal qual a natureza de suas próprias vidas.
Em tudo chove, em todos chove enorme, caudalosa a cidade escorre.
Como mulher Marina que se pintou, é cinza agora e aborreceu a todos, trazendo seu nevoeiro parado. Chorosa, mascarada, colombina fria, nublando seu rosto de encantos e luz.
Vazia é outra, quando traz os seus olhos pintados dessa cor tão desolada em solidão.
Todos resistem desajeitados, tentando não se molhar na chuva ao ser quase Paulistas, mas não é possível, não adianta a deselegância discreta, pura intolerância tola do poeta diante dessa mágoa urbana de nuvem, de névoa.
A cidade é marinha de cais e maresia, então soluça em aguaceiro.
Promessas de sol restarão lapidadas na memória, mesmo que não cumpridas.
Pessoas e praias ficarão guardadas para o depois, pura birra da natureza.
Nessa hora aparecem os lamentos do dilúvio lavando os braços tropicais do Cristo, sempre abertos a todos que a qualquer tempo orem, pétreos de sua fé no inabalável ceu azul.
Com sua face também de pedra, ele reclama do esconderijo cumuloninbus a que é imposto, nesse calvário acanhado de cidade molhada, resguardada e vestida.
Mais que vestida, encapuzada nos casulos de guarda-chuvas, e mantos, e capas, e panos.
Escondendo o calor dos sonhos de pele, de cidade desejada e quente, na realidade do fastio da correnteza de águas exageradas.
O Corcovado é um guardião da baía de Guanabara, feia e fria agora, observador acabrunhado que a tudo vê, que a tudo nota, sente calado.
Também calada, toda a cidade em águas, numa postura combinada sem palavras, aguardando que a tristeza morra nos caminhos tortos da Niemeyer.
Onde o oceano tem raiva, e irado rebate na pérgula, gritando mágoas incontidas.
Demarcam os seus espaços, terra e agua, agua e gente, gente e pedra, desaparecendo nas teias das espumas brancas de força bruta e quente, como aguardente.
Ondas de dor arrebentando nessas pedras, que apanham pregadas como fieis penitentes, arpoados com o arpão do sal e o iodo da cura, padecentes em ebulição de fervura, torturadas pelas águas .
O mar invade tudo, lambendo o corpo nu da pedra do arpoador solitária, com sua língua branca é íntimo, deixando-a úmida.
Numa solidão confusa dos que namoram e brigam, mas não se separam nunca, a pedra é firme no caminho, enquanto o tudo é agua movente.
Tudo fica calado, fica pra outra hora, tudo se atrasa, fica engarrafado.
Para a tarde no trânsito enquanto não houver outra tarde ensolarada, de depois, do futuro, de outro dia, outra meteorologia, outro tempo, outra vida, outra verdade comum á claridade do Equador.
Como o sentimento profundo e mudo de fim de amor, quando o coração fica calado, preservando-se, porque quando acaba o amor o que resta é o silêncio, o tempo é adestrado ao silêncio triste.
A tristeza do fim de um amor é o butim da solidão.
A cidadela de festas aguarda na intimidade das suas paredes concretas em ausência. Tudo é memória, tudo é o fim, só o silêncio fala seu minuto de glória.
Resguardando as avenidas das pernas e corpos, nos chiados dos pneus e espelhos d'agua espirrados, nos barulhos de poças. Onde estarão suas moças? Onde estarão que não as vejo?
Com seus sorrisos de olhos abraçando as esquinas do sol.
Quando chove assim no Rio ele as perde, ficam raras ou poucas, cheias de botas e roupas, tecem pressa nos cabelos das escovas progressivas.
Preservadas no mofo armário dos apartamentos, reclusas dos ventos, nos velhos casacos de inverno falsos, nos escritórios de papel e máquinas.
Nas ruas os comandos apregoam as sombrinhas de dez reais, preciosas chinesas do contrabando, nas bocas dos mercadores da chuva.
Escondidas das águas seus corpos somem, com eles vão também seus trejeitos.
Esvai o fascínio feminino, tudo esta em desamparo, em desalinho.
Descompondo a paisagem natural das praias, o deserto de areia é abandono.
É o exílio temporário das morenas, do caminhar despojado das calçadas portuguesas, também essas feitas de pedras recortadas e juntas.
Devaneios, desejos e encantos são lavados, ficando cinza, tudo é griz, a cidade mingua embalsada nesse engano. O amor não se propaga e quase finda, até que venha o sol e reponha cor em cena com seu giz de luz e brilho.
Sem suas moças o Rio fica perdido, tudo fica perdido sem sua gente, o Rio tem alma fêmea, é cidade feminina. Sem elas definitivamente não vale a pena, sem elas a natureza esfria e não serena.
Mas se isto é tudo, eu não posso ir embora, chove la fora.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Fim de papo(perna bamba é do samba)

Amor-s/d-Bea Cassiano

O amor só começa onde a paixão finda
Quem sofre apaixonado
Não sente o perfume do amor ainda.

Ponto de partida(perna bamba é do samba)

A Luz(!!!)-2008-Mauro Piva


Quem vive solidão de fato,
sabe bem pouco de si.
Não corre riscos de troca,
não retribui nem evoca,
ninguém abraça ao dormir.

Não cabe, pois vive o hiato.
Tem sombras na imaginação.
Traz o peito sem palato,
vende o afeto empalado,
não se arriscando ao perdão.

A solidão corriqueira
traz costume, faz morada
na pessoa acostumada.
Entorna a fria madrugada,
a dois não há brincadeiras.

Tristeza em usucapião,
sujeito cheio de medo
escondido nos segredos,
vive um engano ledo,
protegido de invasão.

Nessa triste condição
fere antes de ferido,
mal amado, mal dormido,
esse peito em si contido,
vai responder a questão.

Como aposta primeira
resposta mais aguerrida,
para quem servirá a vida,
se não for bem dividida
para então ser vida inteira.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Eterno(perna bamba é do samba)

S/título-1986-Nobuyoshi Araki


 Alguns dizem que o amor é eterno.
Isso não faz sentido algum.
Vestem-lhe roupas, gravatas, ternos.
Eu por mim acho bom o amor nu.
Essa talvez seja a sua dor.
Quer sair por aí à vontade, pelado.
Isso de fato despede o pudor.
Tolos o querem empacotado.
Mas em conserva ele não respira.
Depois, com tempo, perde validade.
Deixe-o andar sem panos ou tiras.
O amor precisa de publicidade.
Vamos depressa tirar-lhe o vestido,
para que transpire, já que é alma de pele.
Sem ser assim, não terá acontecido.
Há que despi-lo para que se revele.
sem a farda da propriedade,
liberto, será só de quem o tem,
desde que sem formalidades,
O queira despido como convém.
Com tal respeito a esse alimento,
Que se revelado, a todos seduz.
Só quem tem medo o deixa guardado,
Mas só quando livre é vivo, é luz.

A Lágrima(perna bamba é do samba)

                                                 Lágrima Da Sereia-1965-Mabe


A lágrima molha o homem
Mostrando um ser só humano
no sal do choro há sentidos
Divergentes dos profanos
Puro é personalidade
Todo choro é destemido
Comum a qualquer idade
Dos adultos aos meninos
Não esconde um Deus de vidro
salvaguardando os enganos
Pede respeito aos ouvidos
Aquele que está chorando
Pois se o choro verte à face
Da vida é que se assenhora
brota nele a fio, o brio
quando é a alma que chora

Encontro da tristeza com a alegria(a puta me encantou)

A arte dos balões- s/d-Hackenwerth

Um Certo dia qualquer
não sei precisar com certeza,
mas eu atesto e dou fé,
a alegria foi visitar a tristeza.

Surgiu em corpo de mulher
perfume de dama da noite,
vestiu-se em roupas e frestas
sujeita assim muito afoita.

Deixou bem a vista as festas
Sargaço e cheiro de mar.
Sabor que a tristeza arresta
morrendo pra se matar.

A alegria essa meretriz
esquece a dor e padece
fulgaz tatuada em giz.
Sorri como quem merece,

trazendo mel nos seus lábios.
Vendo enfim a alegria feliz,
a tristeza esqueceu os sábios,
tornou-se assim aprendiz.

Com alma de pouca roupa
bebeu, comeu e cantou,
deu tantos beijos na boca
mergulhos de Jacques Cousteau.

Num canto de boto a sereia
como dois copos de bar
encantos de levantar veias,
até o corpo cansar.

Depois a alegria em afagos
qual boa mas passageira,
a bela fumou seu trago
de erva que faz besteira.

Roubou um pouco de calma,
saiu indo porta afora
furtivamente sem alma.
Como chegou foi-se embora

Então meteu pés, foi a rua,
sumindo em alegria vulgar.
Deixando a tristeza dura,
pra outra tristeza encontrar.

Discórdia(perna bamba é do samba)




Galos-1959-Djanira

Tumulto na harmonia,
Ação em controvérsia
Da pele e da alergia.
Barulho na conversa.
A fartura e a miséria.
Um talho no pescoço.
Ser velho sem ser moço.
Cão que briga por osso.
Garganta e a espinha.
Desdita em alvoroço.
Um murro entre as caras,
Um AK que dispara
a perdição das balas
Quanto há de covardia,
Entre o pensar e a fala.
Desvio de amizade.
Amar sem ter vontade.
Faltar com a verdade.
Pimenta em demasia.
Tumulto na cidade.
O ato e a letargia.
Tristeza da alegria
Na inútil serventia
Da escuridão das vidas
Se ausente é a poesia.
.

Dia do samba(perna bamba é do samba)

Carnaval, 1984, Carybé



















Tem samba na central
Tem samba na central
Tem samba na central

Dezembro tem carnaval
No vagão minha Portela
Paulinho é a fera
E o Paulo é fatal
A velha guarda se esmera
Caminho das pedras
Mostrando o sinal.

Mangueira outra primeira
Estação Cartola.
Cachaça total.
Lá vem cacique de ramos
Dona Ivone Lara
Fundo de quintal
Salgueiro trouxe o Aldir
No vagão botequim
Que é o seu hospital
Mestre na arte do samba
Cana de gurufim
Ginga de futebol

Quem bem nasce lá na vila
No vagão estréia
Matinália é gol
Martinho vê essa filha
Luiz Carlos brilha
A escola chegou.

Tem também bafo da onça
Onde o samba desponta
Cheio de moral
Sob o sovaco do Cristo
Vadico feitiço
Dia nacional

Império serrano já tinha
O vagão da serrinha
Num jongo dileto
Moças sambando agora
Lembrando das rodas
Do Grande Aniceto

Outro vagão desatina
Na Leopoldina
Mostrando que é
Uma escola de samba
Descolada e bamba
Sambando no pé

Novo vagão vai enchendo
Gente vem surgindo
Olha o galocantô
Trazendo no cavaquinho
Um Zeca pagodinho
É com nesse que eu vou.

Trem da Tereza Cristina
Esse tambor de mina
Cantando somente
Um novo samba que brota
Tocando em volta
Comuna semente

Lá no vagão de Nilópolis
Trazendo própolis
Neguinho entrou
Era um vagão passarinho
Parecia ninho
Para beija flor.

No vagão apaixonado
Um samba apertado
Fazia calor
Tinha marido enganado
Pois se é simpatia
É quase amor.

Outro vagão vai de letra
Cordão bola preta
Arrastando gente
Todos seguram chupetas
Não é micareta
É o samba somente

Olha o Bezerra que canta
Falando de planta
Que é bem popular
Mas da uma fome danada
Que o vagão cala
Pra se alimentar.

Quando fazia zoeira
A Cantar João nogueira
Num outro vagão
Era o clube do samba
Lembrando o poeta
Só era emoção.

Vindo lá de Niterói
Mesmo vendo que dói
O vagão vale ouro
Num samba que nos encanta
A sair da garganta
Lá do Viradouro.

Tem um vagão que delira
Os gigantes da lira
Meninada quente
Com seus palhaços e banda
A todos encanta
Assim miudamente.

Outro vagão a lotar
Escravos da Mauá
Velha beira do cais
É tanta gente a cantar
Lara lá laraia.....
Mas ainda chega mais.

Vinha tão cheio e indolente
O Vagão mocidade
De Padre Miguel
Era de felicidade
Cantando contente
Um samba fiel.

Oswaldo cruz é o caminho
Surdo e cavaquinho
Há pandeiros por lá
Onde o samba não dorme
Todo dia é do samba
Pra gente acordar
.

Poema mudo(perna bamba é do samba)

Estátua de Fernando Pessoa, no café A Brasileira, ao Chiado, Lisboa.



Eu não sei dizer poesia,
o que sei é ser poeta.
Sem nenhum alto relevo,
então, o que sinto escrevo.
O texto é fala desperta,
para aplacar a agonia.
Embriagada e indiscreta,
da boca a língua alfabeta.
Sobrando antropofagia,
todo corpo é poesia,
sem isso ser uma meta.
Nas letras a linha iradia,
descrita onde não cabia.
O papel despe a utopia,
Palavra formando a rima,
D'ideias em pernas abertas.

Flexões(perna bamba é do samba)

Orixá-1966-H. Carybé
Cuidado,
Preste bastante atenção
a vida vai te pegar.
Vai te arrastar pela mão.
cuidado,
sem ela vem solidão,
Muito cuidado agora.
A vida tem garra afiada
e braços pra qualquer lado.
Se ela te vir não te esconde é na lata,
ela é viva e vai te pegar.
Não, não adianta correr,
não escapa, ela te encontra
Onde for em todo lugar.
Não tem jeito amigo,
viver não é coisa à toa.
Vai te buscar pelo umbigo,
não vá então ficar prosa.
Pode até ser uma boa,
ter corpo de ser gostosa
pois mulher é o que ela é.
E ouça não é cor de rosa.
Não é uma coisa qualquer.
Mas olha da vida lhe digo,
também não deixa barato.
Se acaso ela passar por ti,
espero que a ame de fato.
Quando isso não acontece,
com o tempo aparece enfarto,
a vida se desaponta,
faz ponte e fica infeliz.
É bom tomar-lhe bem conta,
ela não permite bis.
Se te amarrar a gravata,
afrouxa rápido agora,
porque quando ela pede passagem
sem dizer pra que te veio,
vai te deixar sem graça,
o medo põe seu arreio.
Portanto tome gosto e raça,
não a perca assim ligeiro.
Pois se ela não sentar praça,
se derramar por inteiro,
cuidado repito, ela mata,
vai te parar primeiro.
Não tem mais nó que desata,
uísque ou carro do ano.
No relógio o ponteiro para.
O que vai sobrar salvo engano,
historicamente é pró-ratada
de posteridade contando.
Mas se o que contar for dinheiro,
dinheiro amigo não chora,
só tem memória fiscal.
Também não sente saudades.
Aí não valerá pena,
vamos lá coragem,
existir destina a historia.
Só izordil não vale.
A vida não é pequena,
pequena seria inútil,
inútil seria vil,
servil ira embora,
cuidado.

Geraldo Achiamé(perna bamba é do samaba)




Meu caro amigo Geraldo
A vida não está prosa
Se puder evitarei
Agulha intravenosa
Dizem que é um veneno
Vou contar-te um segredo
Tenho buracos pequenos[
Se tenho cú, tenho medo
Nas minhas veias o sangue
É pra lavar coração
Apenas algumas picadas
farei até com certa fartura
São as picadas de lei
Do mestre da acupuntura
Afora isso um abraço
Bem cheio do meu afeto
Esse poema a ti eu faço
Pelo hemograma completo.

Parceiros(perna bamba é do samba)



Elasticidade-1912-Umberto Boccione

O cheiro e o gosto
A nudez e o griso
A ruga e o rosto
O gozo e o vício
Silêncio e o grito
A ira e o amor
A passagem e o rito
O peito e a dor
A fome e o almoço
O desejo e o beijo
A carne e o osso
Goiabada e o queijo
O vento e o rosto
O sul e o norte
O olhar e o olho
A anima e a morte
A solidão e o frio
O corpo e a dança
Navalha e o fio
O não e a perseverança
O tato e a pele
A saudade e o adeus
O abraço e a distância
O incrédulo e Deus

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Feijoada(perna bamba é do samba)

Receita facil
Se o samba me convidasse,
pra meter minha colher.
Tiraria assim a dor,
de ser um poeta soturno.
A solidão fria que dista
aos internautas noturnos.
Punha-lhe minha amada
em saia rodada de mulher.
Também pra poder tirá-la,
quando o oportuno vier.
Porque o samba só é bom
se tem calor e a pele sua.
Cantado no céu das bocas
sagradas dos blocos de rua,
Encontra o claro da lua,
e só acaba quando o sol quer.
Tocaria feito o que ouvi,
Donga fazer a prato e faca.
Num encontro de flauta doce,
violões e cavaquinho,
tantã, repique, pandeiro,
surdo e banjo no miudinho,
Trazendo mais alegria,
ao requebrar Lan das mulatas.
Tempero forte que uma tia
herdeira de Ciáta faça,
Charque, feijão, costela,
orelha, pé, couve fininha,
Pimenta, lombo, cebola,
toucinho, paio e cebolinha
Laranja cortada e cerveja,
boa, farta e gelada.
Limão, açúcar e gelo
em boa dose da malvada

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Morrer De Amor

Maria-1948-M. Dionísio

Dor de amor se vacina com outro.
Universo novo e feito diferente.
Fio condutor da mais alta corrente
abraçando em união dois indecentes.
A solidão assim se esvazia em troco,
nos poros abertos dos combatentes.
Dois corpos juntos se chocam, prontos,
como cabelos no pente envoltos,
ávidos a unir nesse coito
a rima feita e o repente.
Língua úmida que é leniente,
a rima em lábios abre-se toda,
de cuja boca o verso entorna.
E a água pura da fala gosa.
Sem a leitura sagaz e quente,
cortante e teso o repente aponta.
Adentrando firme a rima porta
com a força bruta que lhe apronta.
O aríete duro irreverente a monta,
infiltrando-se bem contente,
como quem cava a colher na horta
da rima rica, as palavras postas.
Desfalecendo-as em tons candentes,
Gemidas, gritadas, chiadas e mortas

Chão divino(perna bamba é do samba)

Metamorfose-1999-Hugo E. Escobar


Deus parece mesmo que não me queria.
Forcei a barra parti mais que os outros,
Escorregando embora bem na portaria,
Desci pernas abaixo pra esse mundo louco.
Como louco sendo e a diferença havia,
Aqui me cheguei com tamanho pouco.
Comecei chorando em busca de alegria,
Por mais que eu chorasse, fui ficando rouco.
Fui então buscá-la onde eu não sabia
Com a forja e ferro, sem blefe tampouco.
Com os olhos rasos da mina poesia.
Segui meus caminhos com os passos tortos,
Fui assim brigando, perdi covardia.
Andei como pude e fui por tantos lados,
Percorri as noites procurando os dias.
Esbarrei em amores loucos, descuidados.
Sem a eternidade fez-se a chama fria.
Nesse chão caí com os Atropelados.
Como me salvar do amor não poderia.
Mesmo assim segui peito machucado,
Procurando a vida aonde ela me via.
No caminho vi outros desgarrados
Gente resistente e crente na boemia.
Mas sereno e tempo nos fazem prateados.
Hoje faço versos a essa serventia.
Se algo aqui servir não seja rogado,
Regale-se assim pegue uma fatia.
Há que alimentar calmos afogados,
Na felicidade dessa hemorragia.
essa sendo a sina, Deus seja o culpado.
Por ter feito a vida escorregadia.

Dia dos Namorados(perna bamba é do samba)

Namorados-2006-Tenini

Tendo os corpos ou as mãos entrelaçadas
e com palavras de ordem sussurradas,
felizes eles vão.
Seguem Passeando nas calçadas,
tendo a si próprios como faixas e galhardetes
alusivos à paixão.
Assim todos circulam pelas ruas,
as vezes em silêncio efusivo,
como numa intimidade pública
de gestos e olhares delicados.
Em selênico dia
os amantes saem aos pares,
em uma passeata muito própria,
em defesa dos casais enamorados.
Desfilam unidos pela paz,
pelos riscos,
pelo gozo,
pela dor e pela fúria
de morrer de amor.
Essa data fica perdida,
inútil,
inexpressiva,
àqueles pobres viventes
que não sofrem,
porque não amam.
Como se esse dia passasse ao largo,
vazio,
um dia morto,
fora do calendário da vida.
Num silencioso trato,
quem não ama,
assiste ao passar das horas,
sem entendê-las bem.
Um mistério.
Esse dia é como um tempo
impróprio aos solitários,
dia dos outros,
dos amantes.
Essa comuna
que tem coragem de amar,
posto que para isso seja preciso,
te-la em grande dose.
Sem essa coragem
não há como dar-se um ao outro,
tendo a si como presente vivo.
Não faltam as flores,
entre outros mimos.
Símbolos afetivos de qualquer valor,
mas com alto significado
no penhor do coração.
Taças e troféus a transitar,
como provas incontestáveis dos vencedores
que encontraram no seu par
o calor da razão.

O Sorriso(perna bamba é do samba)

Salomé de stráuss, ópera -2008-Rafal Olbinsk

Ela sorrindo chupa aos meus olhos,
postos a vê-la como sol passar.
Sua boca expandindo energia,
Radiante é calor de verão popular.
É sorriso calmo de praia limpa.
É dia bonito de Maracanã cheio,
brisa pura diverte e garimpa,
bamburrando-me todo sem receios.
Numa felicidade pública é à vistas.
Vestida de abraços, é sorriso veeiro.
Desnudando a face, é sorriso banhista,
espalha perfume de água de cheiro.
Tenho olhos vivos, quando ela esta sorrindo.
Seus lábios abertos, posso contar,
Juro e lhes digo, não estou mentindo,
Ela quando sorri traz na boca o mar.

José(perna bamba é do samba)

Foto: Ricardo Leone-O Globo

Roubaram os óculos do poeta,
Míope é a poesia do ladrão.
Quem rouba versos desperta,
Quem rouba bronze, esse não.
Quem sabe talvez tenha fome
Ou falta-lhe ser cidadão.
Se o bronze tempera o homem,
Como se faz para errar na mão?
Pergunta que a mim inquieta.
Roubaram os óculos do poeta,
Por quem nele os versos somem
Como aos olhos na escuridão.
Roubaram os óculos do poeta
O que fazer para achá-los então
Estarão perdidos no abandono
Encobertos em papelão
Rasgados e maltrapilhos
Ou foram para coleção?
Foram-se os óculos do poeta
Levados assim sem perdão.
Alguém os levou qual taça
Derretida em má fundição.
E agora José que desgraça
Quantos olhos te levarão?

Soneto triste(perna bamba é do samba)

  Tristeza-Oswaldo Guayasamín

Quando a tristeza chega
Como o ferir de um punhal
Cala-nos a beleza
Sobrando a terra e o sal

Mas se a vida é surpresa
E surpresa é atemporal
Sempre virando a mesa
Como lhe é natural

Se não me falta à certeza
Essa será a destreza
Sobrevivendo ao mal

Tristeza não é fraqueza
dissipa-se num poema
Antes do punho final

Bailarina(perna bamba é do samba)

A Bailarina-Oswald de Andrade Filho


Se o amor é cego
Moça do corpo de baile
Vou toca-la em braille

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Sambabaca(perna bamba é do samba)

Carnaval em Madureira-1924- Tarcila do Amaral 

O sambista
jamais esta fora de moda.
Como o samba de roda
de bater na mão.
Mesmo que se cante
agora marmota,
um mal samba
sem nota,
bastante idiota,
sem fé, sem excitação.

Roubaram o nome bonito,
pagode.
Fazendo a mesmice
de um canto ladrão.
Quero mesmo é saber
se a carola sacode,
aonde os novos Cartolas
das sombras virão.

Se o samba agoniza,
pode crer não morre.
Ocorre nas veias,
ruma ao coração.
Se os tolos não sabem,
onde fica o Estácio.
De Ismael
não duvido,
jamais saberão.

Bom samba resiste
como por pirraça,
Juntando quem o faça,
tristeza e paixão.
Se alguns esqueceram
os cantos da raça,
podem ir a Portela
e reaprenderão.

Aqueles que cantam
um Samba babaca,
Sempre devem,
enfim, temer o cavaco.
Porque o samba
não é uma falsa bravata,
bola sete é em vão
quando escapa do taco.

Portela querida ,
escola de águia,
quero ver esse azul
de novo campeão.
Com um samba que faça
rodarem as saias,
enchendo de alegria
a nova geração.

Samba tem mesmo,
que fazer sentido,
ser ouvido no peito,
falando à razão.
Pois senão,
será só um canto perdido,
um vazio,
um hiato,
uma ilusão.

Samba frio é trégua
não pede passagem,
cantam todos,
ou levanta a multidão.
O sambista nega
essa falsa roupagem
Refazendo o feitio
em forma de oração.

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Um samba para o meu amor(perna bamba é do samba)



Samba em terreiro- H. dos Prazeres


No ronco a cuíca grita.
Soalhas atiçam pandeiros.
Soprada a flauta fica aflita.
O piano é um mandingueiro.

Repique vem fazendo finta.
Cavaco é pirão primeiro.
Tan-tan faz coro em voz retinta.
Violão tenor é brasileiro,

Também tem o de sete cordas;
De seis é o violão guerreiro.
Íntima ao baixo a bateria aborda
o franzino tamborim ligeiro.

Trompete arrasa em desafio,
os agogôs são seus parceiros,
ganzás em profusão gentios,
a caixa vem de mensageiro.

O bandolim num solo acorda.
O surdo é pênalti certeiro.
Trombone arrombando a porta.
Nos vocais o Rio de Janeiro.

Clarinete e sax sopram em par.
No prato o samba vem com fome.
Tudo isso pra te ver chegar,
Sambando pra amar seu homem.

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Desassossego(perna bamba é do samba)

Emygdio de Barros- sem data

Escrevo agora aquilo que não digo.
No papel em tela o que não penso.
O poema terá seu próprio umbigo,
as palavras serão soar imenso.
O silêncio duro é com quem brigo.
Às vezes perco, às vezes venço.
Sendo este texto meu castigo,
Carrego-o, assim como entristeço.
O poeta é um pássaro no visgo.
A palavra escrita é desapego,
libertada em face do inimigo,
vai à vida e o verso é longevo.
Pois se escrevo aquilo que não digo,
no papel é grito o que escrevo.
Novo verbo explode em estampido,
se estou vivo é por desassossego.
Verve, viril veia, vem vadio verso,
esse aqui que em mim mesmo escrevo,
Tambem nele é que busco meus sentidos,
e com eles brigo eu comigo mesmo.

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/

Falha Tectônica

Grafite_ Foto- 2009 de Fefe_ Talavera

Olho para mim e me assusto sempre.
Pois em mim já não sou o que pensava.
Nesse susto vejo o quanto é chapa quente,
Não a idéia nova por vir, futura,
Mas aquelas que guardei passadas.

Nelas queimei os meus roteiros desmedidos, tortos.
Algo que minha cabeça pensava não serem nada.
Dessas cinzas reunidas forjei o esquecimento.
Tola idéia sobre arquivos das idéias maltratadas.

Enganando-me no tempo,
elas se reavivam noutro tempo.
Como o olhar das outras noites
sobre a hora azul da nova madrugada.

Olhar próprio de um Deus nativo de meu jeito,
Onde sorrateiramente essas idéias se instalaram.
Inquilinas inconcientes não denunciadas
de morada e desejos próprios,

Historiando assim e arrastando mesmo a mim,
àquilo que em minha boca em forçado desajeito,
Insistentemente em silêncio se calara.
Como um Deus demônio de alma safada.

Fazendo de meu forte o texto mudo
Calabouço profundo de águas paradas.
Penhora pobre de uma vida ilustrada em tudo
Luta louca tão atualmente obstinada.

Sigo assim, embora nessa luta,
Eu apenas de mim sou o egoísta.
Pensava sair de ombros, ileso.
Quando de fato inutilmente nos escombros,
apenas fartamente me enganava.

http://www.mauro-paralerpoesiabastatercalma.blogspot.com/